Ex-Ministra do Meio Ambiente explica a condição de centralidade do Brasil diante a produção sustentável de alimentos e a descarbonização das atividades econômicas
Co-chair do Painel Internacional de Recursos Naturais das Nações Unidas, a bióloga Izabella Teixeira foi ministra do Meio Ambiente de 2010 a 2016. Ambientalista de referência internacional, ela participou da COP 28 como uma das vozes brasileiras mais destacadas da Conferência. Nesta entrevista exclusiva para o Prato do Amanhã, Izabella mostra o novo papel esperado do Brasil na transição para uma economia de baixo carbono.
Como a senhora analisa o momento da COP 28?
Estamos discutindo o que muitos defendem como um momento disruptivo do homem com a natureza, uma crise climática e de biodiversidade. O que se observa é que a dinâmica política do mundo não se limita a governos e temos, agora, um engajamento da sociedade civil e da iniciativa privada, mas ele não pode ser somente ativismo ou processo de denúncia. É preciso permitir a convergência de interesses, visões e responsabilidades. É preciso ser corresponsável por aquilo que estamos pactuando e entender o que precisa ser adotado para que se possa mudar.
E o Brasil nesse cenário?
Um dos temas mais sensíveis do debate político no mundo – e que tem no Brasil uma centralidade – é exatamente essa equação de natureza, de proteção de floresta e de ecossistemas e da produção de alimentos e de energia, inovação e comércio internacional. Tal equação é importante para o Brasil tomar uma decisão a partir desse século. No século passado, o país tomou a decisão de ser um produtor de alimentos porque importava alimentos. Isso exigiu do governo uma decisão inovadora, que vai desde a criação da Embrapa até uma nova estrutura de negócio, de financiamento. O Brasil foi estruturando empresas no mundo e, obviamente, continua não só na produção de alimentos, como na de energia de biomassa.
E hoje, isso muda?
O Brasil precisa tomar outra decisão, porque o que foi feito antes teve impactos positivos e negativos e é preciso corrigir a rota dos impactos negativos, sendo que o mais evidente é o desmatamento. O banimento do desmatamento é uma condição política para a liderança econômica da agricultura brasileira. A liderança da agricultura não é só porque somos capazes de produzir alimentos e ter modelos de negócios eficientes e competitivos no mundo de negócios internacional e nacional. Ela acontece também pelo fato de que somos capazes de produzir alimentos de maneira mais justa, mais sustentável e mais inclusiva.
Onde entra a rastreabilidade nessa equação?
Se o Brasil é um país provedor de soluções com rastreabilidade, podemos fazer com que o consumidor brasileiro consuma produtos sem desmatamento e sem desigualdade. No dia em que o Brasil estiver fazendo isso, o mundo estará fazendo, porque o Brasil exporta para o mundo. É preciso entender e ter consciência desse papel e da responsabilidade de o Brasil agir primeiro. Temos de acabar com essa desconfiança do mundo sobre nós e essa polarização de “que eu faço de um jeito” e de “que eu estou certo porque faço isso”, como se não houvesse problemas.
É um papel diferente para o Brasil…
Temos várias coisas positivas, mas temos problemas e precisamos resolvê-los e lidar com isso como adultos. “O futuro não é mais como antigamente”, como dizia o Renato Russo. Nós temos de nos ocupar desse futuro de maneira responsável. O Brasil é um dos países que mais produz vida no planeta. Os estudos da Nasa mostram isso. Somos um dos maiores produtores de alimentos, então temos de ser um dos maiores produtores de vida do planeta, de maneira justa e sem fome. Esse é o papel que nós temos: capacidade de produzir energia limpa, acabar com a fome, promover a igualdade, acabar com o trabalho escravo, entender as diferenças regionais do país e as do mundo. Somos um país cuja agricultura pode unir o mundo, porque o Brasil vê esse mundo diverso e o entende.
Como fazer isso na prática?
Um exemplo é que temos tecnologia para exportar cortes de carne porque um determinado consumidor quer comprá-la de um jeito específico. Isso acontece porque o Brasil consegue enxergar o mundo. Está na hora do mundo enxergar o Brasil como um país provedor de soluções e está na hora de nos posicionarmos e corrigir coisas do passado que ainda acontecem no presente. Tem de haver um compromisso de que vamos nos transformar, e isso passa por uma agricultura que nos coloca no futuro de maneira diferente, mais justa, mais inclusiva e mais referenciada com novas tecnologias e modelos de negócios. A agricultura tem o compromisso de nos fazer mais brasileiros e nos deixar mais felizes. Nós precisamos ser mais felizes como brasileiros. O mundo espera isso. Essa é uma maneira de evitar retrocessos, como a volta da fome. Podemos resolver esse retrocesso sendo solidários com o mundo, produzindo de maneira justa. Daí teremos orgulho de ser uma economia de baixo carbono e de agricultura campeã, não só do Brasil, como do mundo.
Fonte: Para toto o amanhã
“O futuro não é mais como antigamente”, explica Izabella Teixeira (pratodoamanha.com.br)
Redação em 13 de dezembro de 2023
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